Tudo o que procurei me esperava nos teus olhos cor de noite eterna

Os dias nunca lhe pertenciam, assim como os lugares em que descansava. Um viajante condenado a cruzar terras e épocas sem jamais conhecer raízes, estabelecia-se na efemeridade, como uma semente plantada em concreto.

Chegou ao vilarejo em um fim de tarde dourado, carregando nos ombros o peso de mil auroras esquecidas. Os habitantes diziam que ninguém demorava ali muito tempo; o vento levava mais que folhas secas, apagava qualquer vestígio de permanência. Era um lugar que parecia existir apenas para os que fugiam.

Entre vozes abafadas do mercado e o perfume de flores murchas, ele a viu. Dona de olhos intransponíveis, caberia o mundo naquele par de íris cor de breu. Ela destoava ao cenário; havia algo de perene em sua presença, na forma como prendia o cabelo suado no calor da sessão de legumes, no balançar das suas cadeiras ao caminhar e até na mordida distraída na maçã que levava na mão esquerda. Tudo em sua existência traduzia uma estabilidade imortal, e subia à boca do homem o estranho gosto da memória — algo que há muito ele negava-se a guardar, como quem rejeita a fragilidade de algo destinado a se perder.

Ela o notou também. Era impossível não notar. Exalava dele uma distinção discreta que preenchia o espaço ao seu redor com uma gravidade tácita. Por um momento, o tempo pareceu parar.

— O senhor procura alguma coisa? — perguntou a voz angélica arrancando-o da sua reflexão estática.

Por um instante, sentiu-se desnudo, e toda a inquietude de anos se cristalizou naquele olhar. Nunca soubera o que buscava, mas agora parecia óbvio: talvez nunca tivesse procurado nada além do que agora o encarava.

Ela inclinou levemente a cabeça, como quem aguarda, mas não insiste. Naquele momento, ele não tinha todas as respostas — e talvez nunca as tivesse. Mas pela primeira vez em uma existência feita de movimento incessante, ele desejou ficar.

E isso bastava.

0 comentários