A raiva que me aflige

 

O veneno de cobra é rápido e, há alguns anos, poderia ser inevitavelmente fatal, mas com a medicina moderna, dificilmente alguém vai morrer por ter sido picado. A raiva, por outro lado, corrói devagar as entranhas e cresce como um verme subindo pela garganta, até cuspir as palavras mais perversas do dicionário em doses inescrupulosas. Ela faz de tudo que é belo, maligno e nefasto. Corrompe o sacro e, tudo o que brilha, enturva num perturbado crepúsculo de cólera.

A ressaca que se sucede é uma impiedosa carrasca para o que restou dessa calamidade. Arranca a pele à chicotadas e exibe ao espelho a medonha criatura sob aquela farsa. Recusada em todas as emergências, evitam contato visual como se a própria Medusa estivesse pedindo socorro.

Para este tipo de veneno, que não leva ao túmulo, mas perverte-lhe a alma, não há antídoto.

0 comentários