Meu peito sensível demais para a dureza da tua alma

Teus passos estridentes atravessaram a porta de mogno pela última vez. O trépido estalar da maçaneta dourada fechando atrás de ti estremeceu até as persianas de linho branco. A sala parecia três vezes maior na tua ausência.

Não te impedi, o silêncio foi o discurso que ouviste dos meus lábios. Ressenti apenas, as plácidas águas escorrendo da nascente cachoeira dos meus olhos. No talhe do meu rosto, ninguém poderia dizer se me doía ou aliviava a tua partida. Depois de doar-me tão inteiramente aos teus enleios, desconhecia quem eu era antes de você.

Desfiz dos móveis que recordavam-me de ti — todos eles — e, ao passo que esvaziava o apartamento, preenchiam-se as fissuras que abriste no meu peito sensível demais para a dureza da tua alma.

Hoje perguntaram-me qual o maior gesto de amor que já consumei e, na maior epifania da minha consciência, respondi: me escolhi.

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